Parafilia
Alexandre Campinas
Ele espreitava. Ela sairia. Mais cedo ou mais tarde. Doentio e compulsivo, ele esperaria horas
seguidas. Dias. Sem comer, sem beber se fosse necessário. Quefazer inadiável. O
ato em primeiro lugar.
Não precisaria ser um estoico, ela era um relógio. Deixou o
modesto prédio do conservatório sem atraso, a violonista. Ela e seu
instrumento. Na primeira esquina, aquele
animal precipitou-se sobre sua vítima. Mau. Bote certeiro. Presa fácil.
Arrastou-a para um terreno próximo. Não se preocupou com os passantes. Despiu-a de suas
certezas. Arrancou, brutalmente, de suas
delicadas mãos, mãos sensíveis de artista, o instrumento caríssimo. Peça de
luthier, feita sob encomenda. Inimitável.
Ainda mantendo seu braço entrelaçado ao da vítima, a
besta-fera tirou uma palheta do bolso da camisa e iniciou sua sequência perversa.
Fez de tudo com ela. Teló, Gusttavo Lima, Jorge e Mateus, Zezé e Luciano, Luan
Santana... Ela gritava, pedia socorro aos transeuntes.
Bruno e Marrone, Edson e Hudson, Rick e Renner, Alexandre
Pires, ele era um monstro. Malícia, Katinguelê, Karametade, Gamação. Uma após a
outra, as músicas iam enchendo o espaço psíquico da moça, que ainda tentava
esboçar reação.
Ao redor da cena tenebrosa, as pessoas já formavam uma
pequena multidão. Uma menina batia palminhas. Uma criança...
A violonista, já sem palavras inteligíveis, gemia arrasada. Seu
olhar, fio de esperança, ainda buscava na assistência daquele espetáculo de
sombras alguma ajuda. Misericórdia. Ninguém.
Ao contrário, todos achavam aquilo muito normal. Eva, Águia,
Peixe, Babado, Cheiro, Netinho, Brown. Aê. Eô. Tudo muito normal.
Ela nunca mais seria a mesma.
3 comentários:
genial...;-)
Compartilho das dores da violinista!
Um psicopata... kkkkkkkkkkk
Muito bom esse conto.
A gente ri e, com isso, espanta o choro.
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