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20 fevereiro 2009


LOUCO POR DESCULPA
Entrou no ônibus com aquele olhar vidrado das pessoas que têm problemas demais na cabeça, ou daquelas que têm juízo mole. Mostrava um semblante aéreo, quase abobalhado. Passou direto pela catraca e nem fez menção de pagar.
- Ô meu chapa, vai pagar não?
- Desculpe.
- É cada maluco que me aparece...
- Já pedi desculpas. Por que o maluco?
- É só jeito de falar... Você foi passando direto... Tem que pagar!
- E só por isso eu sou maluco?
- Pensei que fosse.
- Mas eu não sou.
- Tá certo, você não é maluco.
- Então você me deve desculpas.
- Não me leve a mal, mas eu nunca peço desculpas.
- Olha aqui: eu agi errado e pedi desculpas. Você me ofende e não quer pedir?
- Não peço mesmo, são meus princípios.
- Princípios uma vírgula. Isso é falta de civilidade.
- Está me chamando de ignorante?
- Ignorante, grosso, mal educado ou o que você bem entender.
- Agora quem deve desculpas é você.
- De jeito nenhum. Quem não sabe pedir desculpas, não tem direito de exigi-las.
- Ai meu Deus, eu mereço...
- Merece mesmo. Pensa que todo mundo gosta de levar desaforo pra casa?
- Que desaforo, meu amigo?
- Você me chamou de maluco.
- Tá certo, faz o seguinte, o maluco sou eu.
- É mesmo. Pra fazer gracinha com quem não conhece tem que ser maluco
.- Tudo bem eu sou maluco. Agora vai sentar que você está obstruindo a passagem.
- Só depois de ouvir suas desculpas.
- Não vou pedir desculpas nenhuma.
- Vai sim.
- E quem vai me obrigar, você?
- Se eu não obrigar, o Tetéco obriga
.- Tetéco? Isso lá é nome de gente?
- Não, mas com ele vai ser pior. Você vai perder mais que a chance de pedir desculpas.
- Eu vou perder é a paciência já, já. Com você, com o tal do Tetéco e com o raio que os parta.
- Quero ver mostrar essa valentia olhando pro Tetéco.
- Então vá lá chamar o seu Tetéco e não me encha o saco.
- Tá bom. Fala aqui pra ele não encher o saco.

Quando os passageiros do ônibus viram a arma na mão do sujeito, seguiram o manual de sobrevivência nas cidades grandes: voltaram seus rostos para a janela e passaram a olhar o movimento lá fora, fingindo que nada estava acontecendo. O motorista nem olhou pra trás, nem esboçou reação. Apenas seguiu dirigindo, sem parar em nenhum ponto.

- Que isso, cara. Abaixa essa arma.
- Eu falei que era melhor me pedir desculpas.
- Tá bom, eu peço, mas abaixa isso.
- Agora é tarde. Vai ter que pedir desculpas pra mim e dá um dinheirinho aqui pro Tetéco.
- Então era isso que você queria, assaltar o ônibus?
- Claro que não. Eu só queria as suas desculpas. Mas o meu amigo aqui, o Tetéco, tem esse fraco por dinheiro, fazer o quê?
- Toma, leva a grana, mas aponta isso pra lá...
- Bota tudo aí na sua bolsa.
- Posso tirar meus documentos?
- Claro, tiras as chaves de casa também. Mas deixa o dinheiro.
- Tá tudo aí, tá tudo aí...
- Certo, com o Tetéco você já se entendeu. Agora falta o que me deve?
- O que você quer mais?
- Esqueceu? Tetéco, fala pra ele o que falta...
- Não aponta isso pra mim, por favor.
- Então paga o que me deve...
- Tá bem, desculpa.
- O quê? Não ouvi direito?
- Desculpa.
- Mas o que aconteceu com você? Ainda há pouco estava falando grosso e agora mal se houve a sua voz. Grita pra tudo mundo ouvir: DESCULPA, VOCÊ NÃO É MALUCO!
- Tá, eu grito, eu grito! DESCULPA, VOCÊ NÃO É MALUCO!
- Sou sim. Quer dizer, sou sem ser.
- Ai, meu Deus, o que você quer mais?
- Só dizer que eu não sou doido, mas sou Maluco sim. Esse é o Tetéco e eu sou o Maluco! Dá tchau pro moço, Tetéco e vamos nessa.
- Motorista, pára no próximo!
Desceu do ônibus com aquele olhar vidrado das pessoas que têm problemas demais na cabeça, ou daquelas que têm juízo mole. Mostrava um semblante aéreo, quase abobalhado. Passou direto pela confusão das ruas como se não visse ninguém.

Um comentário:

Giovani Iemini disse...

hehehe, boa história.