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25 abril 2008

OS DENTES NÃO VOLTAM
(Uma velha canção pop'n'roll)


(Alexandre Campinas)





Por que aquele maldito dente tinha que quebrar apenas com uma mordida de pão francês ? Não. Não era na frente, nada que exacerbadamente constrangesse. Mas quebrou. Ficaram apenas cacos relativamente presos na gengiva. Já não é o primeiro. Filosofo na frente do espelho: da mesma forma que vêm, vão-se. Aos poucos. A escovação ? Vai bem. Nada luxuosa, mas nem um pouco omissa.


Ao virem, causam febre. Vi minha febre no espelho à partida. Tava lá. Estampada como manchete da primeira. Como link de propaganda: Browse it, Browse it !, gritava, vociferava. Ardia, acima de tudo. O espelho mostrou tudo. Alice. Pobres, todos, alices. E fui apenas olhar um dente moribundo... É meu Aleph particular, um tanto revisitado, outro tanto curtido. Entretanto jamais mediado como agora. A escovação ? Vai bem. Nada luxuosa, mas nem um pouco omissa.


Houve de ser o espelho quem mo avisasse. E foi bruto ! Apontou o grisalho de tudo, os pequenos sinais e pintas que só percebia transmudarem-se em marcas senis na face de meu pai. Agora tudo parecia queimar-me as ilusões de uma adolescência que já não é. Febre. Há cigarro demais, há fundamento demais para pouca construção. O espelho. Tudo emerge de mim voluptuosamente. Sonhos, planos, o que fiz e o que não. O que pretendo e o que não entendo. Tudo, agora, faz sentido. As chispas fraternas que tanto abalaram, o olhar alheio, perscrutador, inquisitório. Cobranças infindáveis, inquietação irritante. Sou uma falha-que-anda. Um tropeço divino. Um extemporâneo que julga-se atemporal. A escovação ? Vai bem. Nada luxuosa, mas nem um pouco omissa.

O espelho. Guarda-metas de qualquer tentativa de projeção mais funda do que é permitido. Mostra o quão inadaptável sou. Ok, ok... Sem reclamações desta vez. E é ele quem determina. Pauta. Jogo nele o Sá, o Guarabira, o Beto, o Barão, o Taiguara, o Legião, o Lula, o Montenegro, o Noel, O Capital . Ele não reflete. Ou, por outra, belchioriza a resposta: “viver é melhor que sonhar”. A escovação ? Vai bem. Nada luxuosa, mas nem um pouco omissa.


Tudo está maus. "Então foi tudo sonho ?", tento argumentar. Ele responde: “Piegas”. Não. Não são meus, aqueles olhos. Nada ali sou eu. E tudo sou: junto da gengiva, sobretudo, cacos. A escovação ? Vai bem. Nada luxuosa, mas nem um pouco omissa.


O adágio apregoa, e eu tô ligado nele, só nele. Enquanto há vida, há esperança. Do pc, lá na sala, baixinho, porque madrugada, um arquivo mp3 implora, vindo lá do fundo da adolescência: é o Celso quem pede “aumenta que isso aí é rock'n'roll”. E já é um indício. Quase um grito libertário: um suicídio para tudo que é, em direção ao que – ainda – pode ser.


Na seqüência da playlist uma confirmação de que ainda não sou aquele do espelho (embora, desgraçadamente, ele se pareça comigo; e eu, tanto com ele). Uma confirmação de que em mim tudo deverá continuar como é (apesar dos dentes que não voltam) e de que não sou (o único) anjo torto. A escovação ? Vai bem. Nada luxuosa, mas nem um pouco omissa.


Conta aí, Lô, o que o Márcio escreveu:


“Sinais de bem desejo de cais
Pequenos fragmentos de luz
Falar da cor dos temporais
De céu azul das flores de abril
Pensar além do bem e do mal
Lembrar de coisas que ninguém viu
O mundo lá sempre a rodar
E em cima dele tudo vale
Quem sabe isso quer dizer amor
Estrada de fazer o sonho acontecer”



Canta junto aí !


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